• 04 de outubro de 2012
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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A mudança climática chegou e é pior do que se pensava

Em declaração perante o Senado naquele caloroso verão de 1988, adverti aos senadores sobre o tipo de futuro que as mudanças climáticas trariam para nós e nosso Planeta. Apresentei um cenário sombrio das consequências no aumento progressivo da temperatura impulsionado pela dependência da raça humana dos combustíveis fósseis. Mas preciso confessar: fui bastante otimista.

Minhas projeções sobre o aumento global da temperatura se confirmaram. Mas falhei quando não percebi que a velocidade do aumento na média da temperatura poderia influir na ampliação da ocorrência de eventos climáticos extremos.

Numa nova análise sobre as variações de temperatura das últimas seis décadas (publicada em 29 de Março), meus colegas e eu revelamos um aumento impressionante na frequência de verões extremamente quentes, gerando consequências profundas e preocupantes para nosso futuro, mas também para nosso presente.

Não se trata de um modelo climático ou de uma previsão, mas sim de observações das ocorrências climáticas que já ocorreram. Nossa análise mostra que não é mais razoável dizer que o aquecimento global aumentará as possibilidades de haver climas extremos, nem repetir o aviso de que qualquer evento particular possa ser diretamente associado às mudanças climáticas. Ao contrário, nosso estudo aponta que, em relação aos eventos extremos de um passado bem recente, não há outra razão se não a mudança climática.

A onda de calor mortal que castigou a Europa em 2003, a feroz canícula russa em 2010 e a seca catastrófica no Texas e em Oklahoma ano passado, cada um desses eventos pode ser atribuído às mudanças climáticas. E assim que os dados forem reunidos ainda essa semana, o mesmo acontece em relação a esse verão extremamente quente o qual os EUA sofrem agora. Esses eventos climáticos não são apenas simples exemplos do que poderá ocorrer. Eles são causados pelas mudanças climáticas. As chances de que uma variação natural foi responsável por esses extremos são minúsculas, praticamente inexistentes. Contar com essa chance é como pedir demissão do seu trabalho e jogar na loteria todos os dias para pagar as contas.

Há vinte quatro anos introduzi o conceito de “dado climático” para tentar distinguir o desenvolvimento das mudanças climáticas em longo prazo das variações diárias do clima. Alguns verões são quentes, outros frios. Alguns invernos brutais, outros temperados. Essa é a variação natural. Porém enquanto o clima esquenta, a variação natural se altera. Num clima normal sem o aquecimento global, dois lados da figura de um dado representariam um clima mais frio do que o normal; dois lados seriam um clima normal e os dois lados restantes representariam um clima mais quente que o normal. Ao jogar o dado repetidamente, estação após estação, os resultados apresentariam certa proporcionalidade na variação climática ao longo do tempo.

Mas quando se insere a variável do aquecimento global, as probabilidades mudam. Terminaria com apenas um lado mais frio do que o normal, um lado normal, e quatro lados com o clima mais quente do que o normal. Mesmo com as mudanças climáticas, ocasionalmente haverá verões com clima mais frio que o normal ou um inverno tipicamente frio. Mas não deixe que isso te engane.

Nosso novo estudo revisado por colegas pesquisadores, publicado pela National Academy of Sciences, mostra claramente que enquanto a temperatura média do planeta aumenta progressivamente devido ao aquecimento global (acima de 1,5° Fahrenheit no século passado), temperaturas extremas vêm ocorrendo com muito mais frequência e intensidade no mundo todo. Quando expusemos as informações num gráfico, temperaturas frias extremas, e mais, os extremos de calor incomum estão se alterando de modo que ambas tornaram-se mais comuns e severas.

A mudança é tão dramática que agora uma das faces do dado representa um clima onde há maior frequência das altas temperaturas extremas. Tais eventos costumavam ser extremamente raros. Medidas elevadas da temperatura cobriam aproximadamente de 0.1% a 0.2% do globo no período base de nosso estudo, de 1951 a 1980. Nas últimas três décadas, enquanto a temperatura média cresceu lentamente, as temperaturas extremas se agudizaram e agora representam 10% das ocorrências no Planeta.

Esse é o mundo que modificamos e agora temos que viver nele; um mundo no qual as ondas de calor como a de 2003, na Europa, que mataram 50.000 pessoas e secas, como a de 2011 no Texas, que causaram mais de 5 bilhões de dólares em prejuízos. Tais eventos, como apontam nossos estudos, ocorrerão com frequência e intensidade cada vez maiores. Ainda há tempo para agir e evitar o pior, mas estamos desperdiçando um tempo precioso. Podemos enfrentar o desafio das mudanças climáticas com uma taxa gradativamente crescente sobre a captura de carbono derivada das empresas de combustíveis fósseis, com 100% desse dinheiro sendo restituído a todos os residentes legais baseado na renda per capita. Este processo estimularia inovações e criaria uma robusta economia com energias limpas e milhões de novos empregos. Esta é uma simples, honesta e efetiva solução.

O futuro é agora. E ele é quente.

* James Hansen é diretor do Instituto Goddard para Estudos Espaciais da NASA.

** Publicado originalmente no site Eco 21.

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