• 09 de janeiro de 2012
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Ambientalistas esperam pouco da Rio+20, mas defendem mobilização

O ritmo em que os avanços diplomáticos acontecem ainda é considerado muito lento pela maioria dos cientistas e organizações do movimento socioambientalista.


Realizada no fim do ano passado na África do Sul, a mais recente conferência da ONU sobre mudanças climáticas (COP-17) deixou a porta entreaberta para um inédito acordo internacional que abranja todos os países na luta contra o aquecimento global, mas o ritmo em que os avanços diplomáticos acontecem ainda é considerado muito lento pela maioria dos cientistas e organizações do movimento socioambientalista. A necessidade de resolver essa contradição faz com que 2012 seja um ano fundamental para a definição dos rumos da política ambiental internacional, e o ponto alto do calendário de negociações acontecerá na conferência Rio+20, que será realizada em junho no Brasil. Entre o ceticismo e o chamado à mobilização, algumas lideranças socioambientais brasileiras revelam suas expectativas em relação ao evento.

Coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Renata Camargo diz não esperar muito da Rio+20: “Em termos de negociações internacionais, não há expectativa de nenhum novo acordo no que se refere aos temas principais dessa conferência, que são economia verde e governança ambiental para o desenvolvimento sustentável. O que se tem sinalizado é a tentativa de consolidar e reafirmar acordos já existentes para o desenvolvimento sustentável, como cumprir o que diz a Agenda 21, os Objetivos do Milênio, etc”, afirma, ressalvando que são esperados avanços no que diz respeito à proteção dos oceanos: “No encontro prep aratório da Rio +20 em Nova Iorque, vários países sinalizaram vontade política de adotar instrumentos legais que possam garantir mais proteção para as águas profundas”.

Um dos mais experimentados ambientalistas brasileiros, Rubens Born, que é dirigente do Instituto Vitae Civilis e membro da coordenação do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente (FBOMS), também não nutre grandes ilusões com a Rio+20, mas afirma que a mobilização da sociedade civil pode ser determinante para seu sucesso: “Grandes conferências da ONU podem ter resultado de eficácia baixa ou de lento cumprimento quando se consideram também as políti cas domésticas, a assimetria de poder dos interesses em conflito, a fragilidade de mecanismos institucionais de caráter nacional ou internacional, entre outros elementos. É certo também que o contexto atual global não inspira perspectivas de decisões e acordos relevantes na Rio+20. Mas isso não nos permite condutas de ingênua tolerância e omissão”.

A mobilização da sociedade, segundo Born, deve servir como base a um amplo processo de transformação: “O enfrentamento das crises financeira, ambiental e da pobreza requer rupturas com elementos sistêmicos subjacentes ao ideário desenvolvimentista e liberal que orientou o enfraquecimento dos Estados como meio de permitir maior presença global de conglomerados econômicos, por um lado, e a submissão de todos os aspectos da vida aos interesses comerciais e lucrativos, por outro. A gravidade da crise climática também aponta para a necessidade urgente de valorizar outras formas de se viabilizar energia, alimentos, mobilidade, habitação, saneamento, emprego”, enumera.

Um dos principais organizadores dos eventos políticos realizados há 20 anos no Rio de Janeiro pela sociedade civil durante o encontro de cúpula da ONU que passou à história como Rio-92, Rogério Rocco compara os dois momentos: “A Rio-92 trouxe avanços expressivos na configuração das políticas internacionais e na construção de um modelo de sustentabilidade socioambiental. Porém, os encontros que a sucederam tiveram, em geral, resultados decepcionantes. Isso vem acontecendo há duas décadas e aconteceu novamente na COP-17. Isto é, adiaram por mais uma vez a tomada de posições mais firmes quanto à definição de padrões de emissão dos gases-estufa. Com esse histórico, associado às crises econômicas globais, não se pode esperar muito da Rio+20″, diz Rocco, que atualmente é analista ambiental do Instituto Chico Mendes.

“Nova fase”

Especialista em Responsabilidade Social e Sustentabilidade Socioambiental formado pela FGV e com atuação como consultor para diversas organizações do movimento socioambientalista brasileiro, Aron Belinky afirmou em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos que a Rio+20 deve ser vista como o ponto de partida para uma nova fase na construção de uma sociedade sustentável: “O seu grande valor é reunir num mesmo tempo, lugar e agenda as múltiplas frentes e debates que enfrenta a humanidade, incluindo tanto seus movimentos e organizações como os bilhões de pessoas que, simplesmente, se sentem alijados dos processos que decidem os rumos e feitios em que se desenrolam suas vidas individuais e familiares”, analisa.

Belinky é outro que aposta na mobilização social para dar nova dinâmica às negociações diplomáticas: “A Rio+20 foi convocada pela ONU como uma reunião de caráter político, cujo produto final é uma declaração. Não se pode esperar dela, portanto, grandes tratados ou soluções definitivas. Mas podemos, sim, dar início a processos capazes de desencadear transformações que, em prazo relativamente curto, são capazes de fazer a diferença, contribuindo decisivamente para o futuro que desejamos. Identificar e nutrir as sementes desses processos é uma prioridade estratégica, que a sociedade brasileira e mundial precisa se colocar”.

“Definir posições”

Os ambientalistas ressaltam que a Rio+20 é um ótimo momento para o governo brasileiro rever alguns rumos em sua política ambiental: “Uma definição clara de posições por parte do governo brasileiro seria muito bem vinda. Especialmente porque o Brasil, que poderia exercer importante liderança global na construção de um modelo de desenvolvimento com sustentabilidade socioambiental, atualmente implementa políticas que vão de encontro aos conceitos mais básicos de sustentabilidade. A realidade atual nos faz pessimistas, o que demonstra um perigoso quadro para o futuro imediato do planeta, mas tudo ainda pode mudar e o Brasil pode cumprir um papel muito importante”, afirma Rogério Rocco.

Para Renata Camargo, a conferência internacional pode servir para o Brasil definir seu verdadeiro perfil ambiental: “A gente espera que, com a Rio +20, o governo possa internalizar mais concretamente em suas políticas públicas a questão ambiental. Mas, queremos que isso ocorra de forma prática e objetiva, não apenas em discursos e em programas que, muitas vezes, sequer saem do papel. Externamente, o Brasil tem publicizado que o país está fazendo seu dever de casa, especialmente em termos de redução de emissões. Mas, internamente, o que vemos é uma política ambiental fraca, com perdas de antigas conquistas e pouco avanço em termos de políticas ambientais”.

Autor: Maurício Thuswohl

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