• 14 de julho de 2015
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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América Latina avança na sustentabilidade com luzes e sombra

São José, Costa Rica, 13 de julho de 2015 (Terramérica).- Milhões de latino-americanos têm maior acesso a água potável e moradia digna do que há 25 anos, mas a região ainda arrasta os pesados desafios ambientais herdados do modelo de desenvolvimento do século 20, como desmatamento e emissões de gases causadores do efeito estufa.

Quinze anos depois de assinarem os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), os países da América Latina mostram avanços significativos na erradicação de favelas, utilização pela população de serviços de saneamento e acesso a melhores fontes de água. Porém, o progresso em busca de garantir a sustentabilidade do ambiente mostra profundo atraso, provocado por um modelo de desenvolvimento intensivo em combustíveis fósseis, extração de minerais e atividades agropecuárias que reduzem as florestas, como monoculturas e pecuária.

“É um avanço variado, com luzes e sombras”, resumiu José Luis Samaniego, diretor da Divisão de Desenvolvimento Sustentável e Assentamentos Humanos da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). “Há avanços claros e destacados, em geral, em matéria de acesso água e saneamento, e temos a impressão de que esses indicadores serão cumpridos”, afirmou ao Terramérica, da sede do organismo em Santiago do Chile.

Esses temas integram as metas do sétimo ODM, o que compromete “garantir a sustentabilidade do ambiente”, com metas verificáveis com base nos indicadores de 1990 e que devem ser completados até o final deste ano. Então, os ODM serão substituídos por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que os chefes de Estado e de governo dos 193 países da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovarão durante uma cúpula em setembro.

Dentro do ODM 7, a América Latina e o Caribe alcançaram a meta de acesso a água potável cinco anos antes do prazo definido, e entre 1990 e 2015 a população com acesso a uma fonte de água melhorada aumentou de 85% para 95%, embora ainda restem milhões de latino-americanos fora da cobertura.

Entre 1999 e 2014, foi reduzida quase à metade a porcentagem de latino-americanos que viviam em favelas, passando de 37% para 20%, segundo registros da ONU. Porém, isso implica que ainda há carências importantes, com mais de cem milhões de pessoas na região morando em condições indignas.

Samaniego explicou que os avanços no cumprimento desses indicadores falam do esforço em investimento público na região e da clareza com que as metas foram apresentadas. “Quando os ODM foram aprovados, gerou-se um grande impacto nos países e houve uma clareza e um incentivo em termos de monitoramento para que os países se organizassem e pudessem fazer progressos”, afirmou o funcionário da Cepal.

Porém, na hora de incorporar o desenvolvimento sustentável e a variável ambiental nas políticas públicas nacionais, o progresso do objetivo fica obscurecido. Além disso, “em matéria de desmatamento, tampouco estamos indo bem. Entre 1990 e 2010, passamos de 52% de cobertura do território para 47,4%”, pontuou Samaniego.

No informe final da ONU sobre os avanços dos ODM, publicado no dia 6 deste mês, ficou evidente a disparidade do avanço em sustentabilidade ambiental na América Latina. Um documento de síntese da região sobre o informe afirma que “o documento identifica que as florestas estão desaparecendo rapidamente, apesar da criação de políticas florestais e leis que apoiam o manejo florestal em muitos dos países da região”.

As economias latino-americanas ainda são bastante intensivas em carbono. Um mecanismo que permite medir isto é quantos gramas de carbono são necessários para produzir um dólar do produto interno bruto (PIB). Enquanto a média mundial baixou de 600 gramas por dólar, em 1990, para 470 gramas, em 2010, na região a redução foi de apenas 310 para 280 gramas por dólar do PIB no mesmo período, o que Samaniego considera quase estatisticamente paralisado.

Esta é uma visão compartilhada por especialistas regionais do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). “Existe uma correlação quase linear entre crescimento do PIB de um país e seu consumo de energia e, enquanto a matriz continuar baseada em combustíveis fósseis, continuará diretamente ligada a um aumento nas emissões”, explicou Gonzalo Pizarro, assessor regional em pobreza, ODM e desenvolvimento humano para o escritório latino-americano do Pnud, com sede na Cidade do Panamá.

Em 1990, a região emitia cerca de um bilhão de toneladas métricas de dióxido de carbono (CO2) equivalente, menos de 5% do total mundial. Embora a proporção de participação global tenha se mantido até 2011, em questão de duas décadas as emissões da América Latina e do Caribe aumentaram 80% e registraram esse ano 1,8 bilhão de toneladas de CO2, segundo o Pnud. Esta meta do sétimo ODM tem uma particularidade: embora as políticas procedam das decisões internas de cada país, seus resultados têm impacto global.

Esses indicadores como emissões e perda de cobertura florestal são “de saída” e, “apesar de terem uma relação com o bem-estar das pessoas, por outro lado também têm a ver com o modelo de crescimento dos países”, destacou Pizarro em entrevista ao Terramérica. “Em economias baseadas em matérias-primas ou produtos básicos, como é a maioria dos países da América Latina e do Caribe, a taxa de desmatamento continuará sendo alta, pois a pressão econômica para explorar as florestas continuará sento altíssima”, acrescentou.

Segundo o especialista, o desafio a vencer é a matriz energética e as decisões que os países tomam, ainda focados em commodities (produtos básicos comerciáveis) em grande escala, que afetam a biodiversidade. “Enquanto os tomadores de decisão não forem capazes de comparar o beneficio de curto prazo dessa exploração em face do valor real dos serviços ecossistêmicos que a floresta presta, é muito provável que isso continue ocorrendo em grande escala”, alertou Pizarro.

Os especialistas da Cepal e do Pnud reconheceram os esforços ambientais de países da região como Cuba e Costa Rica, que recuperaram cobertura florestal, Chile e Uruguai, que integraram com sucesso as indústrias florestais à sua economia, e Brasil, que reduziu a taxa em sua porção nevrálgica da Amazônia.

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