• 30 de julho de 2018
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Aquecimento duplicou chance de onda de calor europeia

Rede de cientistas analisa extremos do mês de julho no continente e detecta impressão digital da ação humana; eventos do tipo poderão se repetir a cada cinco anos



A onda de calor brutal que varre a Europa neste mês de julho teve sua chance de ocorrer duplicada pelo aquecimento global. Em lugares como a Dinamarca, quintuplicada. A conclusão é de um grupo de cientistas que analisaram em tempo real os dados sobre o fenômeno, enquanto sofriam eles mesmos com o calor.



“Ontem em Oxford fez 33oC”, disse numa videoconferência nesta sexta-feira (27) a climatóloga alemã Friedi Otto, vice-diretora do Instituto de Mudança Ambiental da universidade britânica, suando em seu escritório e com uma garrafa d’água na mão.



Otto integra a World Weather Attribution Network, uma rede de pesquisadores que se dedica a buscar a impressão digital do aquecimento global em eventos extremos individuais, como furacões, secas e ondas de calor e frio.



Eles passaram os últimos dias analisando dados de sete estações meteorológicas na Escandinávia, na Holanda e na Irlanda, países que experimentaram neste mês uma sequência de três dias mais quentes do ano.



Não é que apenas estes países estejam passando por uma situação excepcional: praticamente todo o hemisfério Norte, onde agora é verão, tem medido recordes históricos de temperatura – 51,3oC na Argélia, 37oC no Canadá, 41oC no Japão, 42oC à noite em Omã, 47oC na Califórnia, 33oC na Suécia acima do Círculo Polar Ártico. As estações analisadas, porém, tinham dados digitalizados desde 1900, o que permitiu comparações rápidas com o passado. Um estudo científico foi finalizado nesta madrugada pelo grupo e será submetido a publicação.



A análise dos dados mostrou que, na Escandinávia, onde incêndios florestais raríssimos atingiram a Suécia e a Finlândia – inclusive dentro da zona ártica – os três dias mais quentes de 2018 foram 5oC mais quentes que os três dias mais quentes na média de 1981 a 2010. Na Holanda, foram 3oC mais quentes.



Devido à extrema variabilidade das temperaturas de verão na Escandinávia, o grupo não conseguiu detectar uma assinatura nítida do aquecimento global nesta onda de calor. Mas na Dinamarca, na Holanda e na Irlanda (a parte sul da região estudada) o sinal é claríssimo: não apenas o aquecimento global tornou eventos do tipo duas vezes mais prováveis, na média, como também modelos climáticos alimentados com os dados da onda de calor mostraram que uma trinca de dias infernais do tipo ocorrerá a cada cinco anos.



“A lógica de que a mudança climática provocará isso é inescapável: o mundo está ficando mais quente, então ondas de calor como esta estão mais comuns”, afirmou Otto.



“Você ter mais de 30oC em algumas regiões da Escandinávia é algo absolutamente anormal e sem precedentes”, disse o climatólogo francês Robert Vautard, do LSCE (Laboratório de Ciências do Clima e do Ambiente). “Estamos descobrindo a mudança climática em vez de fazermos algo a respeito.”



No ano passado, a Europa também foi atingida por uma onda de calor, apelidada “Lúcifer”, que elevou as temperaturas para mais de 40oC nos países do Mediterrâneo. Estudos de atribuição publicados à época indicavam que o aquecimento global decuplicava as chances de fenômenos como aquele.



Lúcifer atingiu de maneira especialmente dramática Portugal, onde incêndios florestais mataram mais de 60 pessoas na região de Pedrógão Grande. Nesta semana, o mundo assistiu a mais um incêndio dramático no Mediterrâneo – com mais de 85 mortos nas vilas gregas de Mati e Rafina.



“Eu estudo esse assunto há 22 anos. Naquela época, a mudança climática era um conceito muito abstrato de média global de alguns décimos de grau de temperatura”, disse Geert Jan van Oldenborgh, do Instituto Meteorológico da Holanda. “É impressionante ver que agora ela é algo que você pode ver no nível local, na forma de ondas de calor.”


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