• 14 de junho de 2012
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Cientistas pedem por ações sobre consumo e população na Rio+20

Pesquisadores de 105 instituições acadêmicas de todo o mundo lançaram nesta quarta-feira (14) uma declaração pedindo que os líderes governamentais e empresariais que participarão da Conferência das Nações Unidas para Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) tomem medidas para resolver as questões de controle populacional e padrões insustentáveis de consumo.

O grupo reúne organizações como a Real Sociedade britânica, que no último mês lançou um relatório solicitando que esses problemas fossem resolvidos na Rio+20. O pedido dos órgãos tem um caráter especial, pois é a primeira vez que instituições tanto dos países desenvolvidos quanto dos emergentes se unem para pedir soluções para essa causa.

Além disso, apenas recentemente as questões da população e do consumo passaram a fazer parte da agenda em busca de um desenvolvimento sustentável, e elas ainda não são suficientemente debatidas, afirmou o grupo.

“Por muito tempo a população e o consumo foram deixados de lado devido a sensibilidades políticas e éticas. Esses são problemas que afetam igualmente as nações desenvolvidas e em desenvolvimento, e devemos nos responsabilizar por eles juntos”, comentou Charles Godfray, professor da Universidade de Oxford, que liderou a elaboração da declaração.

“Ambos [população e consumo] são política e eticamente sensíveis, mas é essencial que isso não os leve a serem negligenciados pelos desenvolvedores de políticas”, dizem os cientistas no documento.

De acordo com os pesquisadores, se ações não forem feitas para controlar o crescimento populacional e os padrões de consumo, este último sobretudo nos países mais ricos, todo o desenvolvimento sustentável do mundo corre perigo, já que a população pode se tornar numerosa demais para os recursos disponíveis, ainda mais se o padrão de consumo dos países mais pobres se igualar ao dos países ricos. Isso poderia levar a “implicações catastróficas”.

“A população global está atualmente em cerca de sete bilhões, e a maioria das projeções sugere que ela provavelmente ficará entre oito e 11 bilhões até 2050. Os níveis globais de consumo estão em um momento de alta principalmente por causa do alto consumo per capita dos países desenvolvidos”, diz o texto.

“Estamos vivendo além dos meios do planeta. Isso é cientificamente provado. Estamos agora em um ponto da história humana em que arriscamos degradar o sistema de apoio à vida para o desenvolvimento humano”, observou Gisbet Glaser, do Conselho Internacional para a Ciência.

Para lidar com esses problemas, os cientistas recomendam que os países desenvolvidos ajam para reduzir os níveis prejudiciais de consumo e desenvolvam mais alternativas sustentáveis. Também sugerem o desenvolvimento de políticas de planejamento familiar e maior distribuição de contraceptivos sobretudo nos países pobres, onde as taxas de natalidade são maiores.

“Muitos países africanos estão sentindo os efeitos do crescimento populacional, e estão descobrindo que precisarão lidar com isso a fim de continuarem se desenvolvimento bem o suficiente para resolver seus problemas ambientais”, alertou Eliya Zulu, diretor executivo do Instituto Africano para Políticas de Desenvolvimento.

“Se você observar um país como Ruanda, é um dos países mais densamente povoados na África e o governo acredita que uma das razões por trás do genocídio foi a alta densidade demográfica e a competição por recursos. E a crise econômica que começou no final dos anos 1980 fez as pessoas perceberem que a fim de atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) a população não pode crescer rapidamente”, continuou Zulu.

“Você precisa empurrar as alavancas que estão moldando as decisões de fertilidade. Você não pode salvar o meio ambiente sem políticas de saúde reprodutiva”, acrescentou Lori Hunter, demógrafa.

Por fim, o grupo ressaltou que as resoluções de tais problemas devem andar de mãos dadas, e não devem ser abordadas separadamente. “A mensagem geral é que precisamos de um foco renovado tanto na população quanto no consumo – não é o suficiente observar um ou o outro. Precisamos observar ambos, porque juntos eles determinam a ‘pegada’ do mundo”, enfatizou Godfray.

“O mundo precisa adotar uma abordagem racional e baseada em evidências para resolver os problemas levantados pelo crescimento populacional e os padrões insustentáveis de consumo, uma que respeite os direitos humanos e as aspirações das pessoas e dos países com baixa renda para melhorar seus padrões de vida e níveis de bem-estar”, constatou a declaração.

Por isso, os cientistas enfatizaram a importância de se tratar esse assunto na Rio+20, tanto na reunião principal, que acontece entre os dia 20 e 22 de junho no Rio de Janeiro, quanto nos eventos paralelos, que ocorrem a partir desta semana.

A Real Sociedade britânica, por exemplo, realizará um evento simultâneo para discutir o quão rapidamente as mudanças na população mundial, aliadas aos crescentes níveis de consumo, desafiam a saúde e o bem-estar humanos e o ambiente natural.

Sha Zukang, presidente da reunião preparatória da Rio+20, se mostrou animado com as perspectivas de o encontro desenvolver soluções para esses problemas. “A determinação de trabalhar para o bem comum é encorajadora... todo o mundo está nos assistindo e não podemos decepcioná-los”, lembrou.

No entanto, há poucas expectativas de que essas questões sejam tratadas adequadamente na Rio+20. Isso porque além de o assunto ser abordado superficialmente no documento oficial do evento, há muitas divergências sobre o tema. Uma passagem do texto feita pelos países em desenvolvimento que pedia formalmente pelo combate ao “consumo e padrões de produção insustentáveis”, por exemplo, foi vetada pela União Europeia e os Estados Unidos.

“Eles estão negociando palavras em vez das questões por trás das palavras”, lamentou Glaser.

Autor: Jéssica Lipinski

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