Em busca de cidades verdes
A África, que experimentará uma crescente urbanização nas próximas décadas, terá o desafio de combinar a rápida expansão das cidades e o desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente e a redução da pegada de carbono. A maior parte do produto interno bruto é gerada nas cidades, que são o motor da economia e onde se originam a inovação e a mudança. Por isso, também é nelas que é gerada a maior parte da contaminação e do dano ambiental.
“As cidades respondem por 75% dos gases causadores do efeito estufa porque é onde vive a maior parte das pessoas”, disse Marlene Laros, assessora de política e estratégia da Iclei África do Sul, uma associação global de governos locais dedicada ao desenvolvimento sustentável. Laros falou na abertura da conferência Mudança Inspiradora, que terminou ontem na Cidade do Cabo, onde foram discutidas vias para que as cidades africanas possam responder ao aquecimento global.
“A partir de 2050, 60% da população africana viverá em cidades, bem mais do que os atuais 40%. É um fato que não podemos mudar. Nosso desafio é como enfrentar a urbanização”, ressaltou Laros. Esta especialista sugeriu integrar as medidas para conter a mudança climática com as políticas econômicas e de desenvolvimento para atender, ao mesmo tempo, e não de forma isolada, temas relacionados com pobreza, emprego e meio ambiente.
A mudança climática está estreitamente vinculada com meio ambiente, economia, política, pobreza, segurança alimentar, acesso a água e entorno urbanístico. Se a África quer criar cidades verdes deve considerar todos estes fatores, alertou Laros. Um dos maiores desafios para a criação de cidades verdes é que as nações africanas deverão duplicar sua infraestrutura a partir de 2050 para atender seu rápido crescimento urbano. Isso implicará grandes projetos de construção, uma das atividades mais contaminantes.
“A construção consome entre 30% e 45% da produção global de energia. Usamos entre 6% e 8% da demanda de combustível fóssil para construir. São custos muito altos e nada sustentáveis”, alertou o consultor independente Robert Zipplies. “Precisamos encontrar formas diferentes para proteger o meio ambiente e desenvolver nossas cidades”, acrescentou.
Isto não será fácil, pois o desenvolvimento econômico continua prevalecendo sobre o meio ambiente em um continente onde o alívio da pobreza e a criação de empregos deveriam ser as prioridades de todos os governos. Em cidades como Cidade do Cabo é mais rentável construir estacionamentos do que um parque ou qualquer outro espaço público, apontou Laros.
Devido às políticas de ordenamento territorial e a forças do mercado que favorecem os ricos, os pobres urbanos da África (que constituem a maioria das famílias) são cada vez mais vulneráveis aos potenciais efeitos da mudança climática. Isto coloca em risco a resiliência das comunidades urbanas em todo o continente. Portanto, os urbanistas estão em uma posição ideal para contribuir na luta contra a mudança climática, mas não se envolvem o suficiente na África. apenas umas poucas estratégias municipais analisam os perigos e os fatores de vulnerabilidade diante dos atuais e futuros efeitos do aquecimento global em áreas urbanas.
Reduzir a pegada de carbono de uma cidade teria muitos resultados positivos, como população mais saudável, argumentou Leonie Joubert, pesquisadora e autora de vários livros sobre mudança climática. “As cidades africanas foram construídas de forma expansiva e dispersa, por isso a circulação de mercadoria nelas consome tempo e dinheiro. Seu desenho faz com que emitam muito dióxido de carbono. Para cada caloria que chega à cidade é necessário um serviço ecossistêmico para produzir o alimento e transportá-lo”, contou Joubert.
Isto significa que o alimento transportado para os centros urbanos expandidos tem uma pegada de carbono maior e costuma ser menos fresco e mais processado. “As cidades nos tornam gordos e nos adoecem. Há uma epidemia de obesidade na África, junto com uma grave desnutrição, situação que deriva de significativos problemas climáticos”, explicou Joubert. Segundo ela, uma solução seria ter cidades mais densamente povoadas para criar economias em melhor escala.
“Seria mais fácil e barato criar sistemas de transporte público para reduzir a quantidade de veículos particulares e que houvesse mais pessoas caminhando. Cidades mais densas permitem diminuir o custo dos alimentos saudáveis, assim como a pegada de carbono, porque barateia seu transporte”, sugeriu a pesquisadora. Jouber propôs que se exija cidades mais verdes no âmbito municipal. A mudança climática não é um assunto que deve ser atendido exclusivamente pelos governos nacionais, pois suas consequências são mais sentidas em menor escala.
Os governos locais têm maior relação com as pessoas que a sofrem diretamente e estão melhor situados para construir cidades resilientes, ao mesmo tempo em que evitam retrocessos no desenvolvimento social e econômico, alcançado com muito esforço. “Cada morador da área urbana em um papel a desempenhar, lembrou Joubert. “As políticas nacionais parecem impenetráveis para as pessoas que andam a pé, mas é muito mais fácil mobilizar as pessoas nas cidades”, ressaltou.