Empresas públicas e privadas faturam com a reciclagem de entulho
Usinas de reciclagem, em Belo Horizonte, reciclaram 112 mil toneladas de material em um ano. Empresas que utilizam a matéria-prima podem ter redução de custos.
Toda obra gera entulho. É o dono da obra quem deve assegurar a destinação correta disso tudo, normalmente os aterros. Quando isso não acontece, cerâmica, gesso, cimento, concreto, vergalhão, madeira e outros materiais aparecem abandonados em terrenos baldios, encostas de morro ou nos leitos dos rios e lagos.
No Brasil, são recolhidas oficialmente 33 milhões de toneladas de entulho por ano. Material suficiente para construir quase 500 mil casas populares de 50 metros quadrados cada.
Mas quem estuda o setor de construção civil admite que a quantidade gerada é muito maior que essa. Há quem não veja no entulho problema, e sim uma solução. Em Belo Horizonte, por exemplo, o que é coletado nas ruas é levado para usinas de reciclagem.
Tudo o que chega é despejado e espalhado no pátio. A água ajuda a baixar a poeira. Aí começa a coleta das impurezas.
Tudo que não pode entrar na reciclagem do entulho, é impureza, e a cada dia são separadas 10 toneladas de impurezas, que vai para o aterro. O britador tritura todos os materiais em cinco diferentes tamanhos de grãos.
Uma usina de reciclagem de entulho é uma linha de montagem de diferentes material de construção como, por exemplo, brita, é muito comum para quem está fazendo obra, precisa de pedrinha. Ela vai substituir a brita natural na elaboração de blocos, pavimentação, meio fio, então substitui o material natural. Esse material, que antes seria lixo, passa a ser insumo para as nossas obras.
“Se eu fosse buscar no mercado para todas as obras municipais seria uma despesa importante, não só o material, a brita e a areia, como o material que a gente usa base e sub-base de pavimentação, cobertura de valas”, fala o diretor de Planejamento da Sup. Limpeza Urbana/BH, Lucas Garilho.
A primeira usina foi inaugurada há 17 anos. Hoje são três em atividade, transformando 460 toneladas de detritos, por dia, em matéria-prima para a construção civil. Apenas no ano passado, Belo Horizonte reciclou mais de 112 mil toneladas de entulho.
Com esse material seria possível construir:
- 1.651 casas populares com 50 metros quadrados;
- 34 quilômetros de ruas com dez metros de largura;
- 67 escolas com mais de mil metros quadrados.
Se fosse comprar esses materiais no mercado, Belo Horizonte, teria de gastar aproximadamente R$ 7 milhões por ano.
“Um bloco no mercado, ele está em torno de R$ 1, R$ 1,20. Para nós sai com uma redução em torno de 40% um valor menor do que esse. A gente tem uma economia de 40% em cada bloco”, conta Garilho.
Não é difícil encontrar na capital mineira construções feitas a partir do entulho reciclado. É o caso de um galpão de pneus velhos.
O piso foi feito de entulho, paredes feitas de entulho. À primeira vista não dá para identificar a origem. A pergunta que interessa é: dá para confiar, é seguro? “Para esse tipo de construção, um piso mais grosseiro, um bloco de vedação, o entulho reciclado ele pode ser tranquilamente utilizado”, afirma Garilho.
O setor privado também passou a se interessar pelo entulho. Nossa equipe visitou, em São Paulo, uma empresa que instalou cinco unidades de reciclagem pelo país. Duas delas, na capital paulista.
Criada há três anos, a empresa já transformou em matéria-prima para a construção civil 200 mil toneladas de entulho. “É uma solução econômica para as empresas que utilizam por ser até 30% mais barato que o produto natural”, fala o sócio da Estação Resgate, Gilberto Meirelles.
Para o empresário, o potencial de crescimento desse mercado é proporcional a quantidade de entulho que ainda é abandonada no lugar errado. “Hoje em dia a gente estima que praticamente metade do entulho gerado não vão para aterros licenciados. Só aí a gente está observando que tem uma grande oportunidade de matéria-prima para ser reciclada”, completa Meirelles.
Num canteiro de obras em São Paulo, até mesmo as impurezas recebem a destinação correta. São separadas na origem para facilitar a reciclagem. “Do todo da obra, em linhas gerais, esse entulho representa 50%. O resto seria metal, madeira, plástico, papel, gesso, já destinados para reciclagem”, diz o gerente de Desenvolvimento Tecnológico-Cyrella, Alexandre Amado Britez.
A construtora treina e conscientiza os funcionários a gerar o mínimo e reaproveitar o máximo do material. Isso reduziu em 35% a quantidade de entulho gerada em cada obra e o que é produzido vai para uma empresa contratada pela construtora para reciclagem.
Esses são exemplos de que, aos poucos, o Brasil vai descobrindo a riqueza do entulho. Menos mineração. Menos custos, mais inteligência na hora de construir o novo, reaproveitando o que nunca mereceu ser chamado de velho.
* André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em Gestão Ambiental pela Coppe-UFRJ onde hoje leciona a disciplina geopolítica ambiental, professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-RJ, autor do livroMundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em Transformação, coordenador editorial e um dos autores dos livros Meio Ambiente no Século XXI, e Espiritismo e Ecologia, lançado na Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro, pela Editora FEB, em 2009. É apresentador do Jornal das Dez e editor chefe do programa Cidades e Soluções, da Globo News. É também comentarista da Rádio CBN e colaborador voluntário da Rádio Rio de Janeiro.
** Publicado originalmente no site Mundo Sustentável.