• 17 de fevereiro de 2017
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Enfim, um não recorde climático

Dados da Nasa mostram que janeiro de 2017 é “apenas” o terceiro mais quente da história desde o início dos registros, mas não se anime: Donald Trump e Michel Temer estão aí para corrigir essa falha.



Os últimos 18 meses têm sido tão pródigos em recordes climáticos que quando a Terra deixa de bater um isso vira notícia. Pois bem: dados divulgados pela Nasa nesta quarta-feira (15) mostram que o mês de janeiro de 2017 não foi o mais quente da história. Foi apenas o terceiro mais quente. Ufa.



Segundo as medições combinadas de temperatura da superfície terrestre e oceânica, o mês passado foi 0,92oC mais quente que a média do mesmo mês para o período 1950-1981. É menos que o 0,96oC de 2007, ano em que o Ártico bateu seu primeiro recorde assustador de perda de gelo. E muito menos que o horroroso 2016, quando a temperatura global chegou a 1,13oC acima da média de meados do século 20.



O ano passado foi o mais quente desde o início da série histórica de registro global, iniciada em 1880. Terminamos com uma média planetária 1,1oC mais alta do que no período pré-industrial, perigosamente próxima do 1,5oC considerado o “centro da meta” do acordo do clima de Paris. Os dois anos anteriores a 2016 já haviam batido recordes.



Só que 2016 teve uma boa desculpa para ser tão quente: foi um ano de forte El Niño, o aquecimento cíclico do Oceano Pacífico. E os El Niños, como sabem os leitores deste blog, têm o condão de jogar os termômetros para cima no mundo todo.



O não recorde de 2017 é significativo (e algo assustador), porque nós deveríamos estar agora na fase oposta do El Niño: a La Niña, que em tese ajudaria a resfriar o mundo. Ela foi detectada no segundo semestre do ano passado, depois que o El Niño desapareceu, seguido de uma fase neutra de temperatura do Pacífico. Mas a tendência subjacente de aquecimento era tão forte que o La Niña aparentemente não “colou”.



“A La Niña não conseguiu fluir nem no oceano, nem na atmosfera”, disse o climatologista Francisco Eliseu Aquino, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “Quando o Pacífico tentou reverter, o planeta ainda estava muito quente e a La Niña não conseguiu se configurar globalmente”, prossegue.



O efeito é semelhante ao de tomar um banho rápido depois de fazer exercícios puxados: por mais que a água esteja fria, o corpo continua suando por algum tempo depois. A diferença é que o regime de aquecimento da Terra não dá sinal de que vá parar. E menos ainda no que depender da nova configuração do poder global.



Nos EUA, Donald Trump parece disposto a cumprir todas as suas promessas de campanha, que incluem “cancelar” o Acordo de Paris e acabar com a EPA (Agência de Proteção Ambiental). O plenário do Senado, dominado por republicanos, deve aprovar até o fim da semana o nome do negacionista climático Scott Pruitt como administrador da EPA – uma agência que ele passou a carreira processando. Analistas temem que Trump possa estimular outros países, em especial a Rússia, a não tomarem medidas contra as energias fósseis, o que seria desastroso para as metas de Paris.



No Brasil, onde a taxa de desmatamento na Amazônia subiu por dois anos seguidos, o presidente Michel Temer sentou-se no colo dos 244 deputados da bancada ruralista – cuja agenda para 2017 inclui eliminar o maior número possível de regulações ambientais, inclusive o licenciamento e a reserva legal do Código Florestal, o que tende a tornar mais fácil a vida de quem desmata.



No ano passado, Temer já reduziu uma unidade de conservação na Amazônia por Medida Provisória. E seu braço direito, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB-RS), estuda cortar 1 milhão de hectares de cinco áreas protegidas no sul do Amazonas, medida que beneficiaria grileiros e madeireiros locais.



Na última terça-feira (14), Temer participou de almoço da Frente Parlamentar da Agropecuária – o sinal máximo de prestígio que qualquer grupo do Congresso pode almejar. No convescote, o presidente discursou: “Quando nós, no governo, dizemos que o Brasil tem rumo, a primeira direção para a qual olho é exatamente a agricultura, o agronegócio”.



O aumento do desmatamento apenas em 2016 e apenas na Amazônia elevou as emissões do Brasil em 130 milhões de toneladas de gases de efeito estufa — o equivalente a quase 7% de tudo o que o país emitiu em 2015. Temer talvez pudesse dar uma olhadinha nisso também.


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