• 19 de setembro de 2012
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Expansão da urbanização ameaça biodiversidade

Cidades devem avançar mais de 1,2 milhão de quilômetros quadrados em todo o planeta até 2030, afetando 214 espécies em extinção e ameaçando pelo menos 15% da Mata Atlântica e 2,5% do Cerrado no Brasil
Um novo estudo publicado no último mês no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) revelou que o rápido crescimento da urbanização está ameaçando diversos hotspots* de biodiversidade por todo o mundo, colocando muitas espécies em perigo de extinção.

Segundo a pesquisa, o aumento da população mundial e as migrações das áreas rurais farão as comunidades urbanas chegarem a cinco bilhões de pessoas até 2030, expandindo as cidades em 1,2 milhão de quilômetros quadrados, o equivalente a 20 mil campos de futebol americano por dia nas primeiras três décadas do século.

As áreas urbanas que mais crescerão estão na Ásia, principalmente na China e na Índia, mas os impactos ambientais devem ocorrer pelo mundo todo. De acordo com a análise, atualmente 1% dos hotspots de biodiversidade são ocupados por regiões urbanas, mas até 2030 esse número deve saltar para 3%.

Com a mudança direta do uso da terra, estima-se que 1,38 bilhões de toneladas de carbono, ou cinco bilhões de toneladas de CO2, sejam liberadas para a atmosfera. Além disso, cerca de 214 espécies atualmente listadas como ameaçadas ou criticamente ameaçadas pela Aliança por Extinção Zero (AZE) serão afetadas pela expansão urbana, sendo que 20 delas sofreriam uma completa urbanização de seu habitat. No Brasil, pelo menos 15% da Mata Atlântica e 2,5% do Cerrado estariam ameaçados pelos novos centros urbanos.

“A África e a Europa devem ter as maiores porcentagens de espécies AZE afetadas pela expansão urbana, 30% e 33%, respectivamente. No entanto, as Américas terão o maior número de espécies afetadas pela expansão urbana, 134, representando um quarto de todas as espécies AZE na região”, escreveram os autores da análise.

O estudo sugere que ao invés de ser um assunto apenas local, das regiões que são urbanizadas, o fenômeno é uma questão global, já que outras áreas são afetadas indiretamente pelo desenvolvimento das cidades.

“A urbanização tem sido negligenciada como fator de desmatamento e degradação e como contribuição para as emissões de carbono. As projeções são bem preocupantes. O estudo eleva a questão de uma escala mais regional para uma escala mundial”, afirmou Hilda Blanco, diretora interina do Centro para Cidades Sustentáveis na Universidade do Sul da Califórnia, que não se envolveu na pesquisa.

“A urbanização é muitas vezes considerada uma questão local, mas nossa análise mostra que os impactos diretos da futura expansão urbana nos hotspots globais de biodiversidade e sumidouros de carbono são significativos”, concordou Karen Seto, principal autora da análise e professora de ambiente urbano da Escola de Silvicultura e Estudos Ambientais de Yale.

“O mundo vivenciará uma era sem precedentes de expansão urbana e construção de cidades nas próximas décadas. Isso não é uma questão limitada a um lugar ou país, mas é uma tendência global em larga escala; estamos agora no século da cidade. Os desafios ambientais e sociais associados serão enormes, mas também o serão as oportunidades”, acrescentou Seto.

No entanto, os autores reconhecem que o estudo tem imprecisões e não apresenta todo o impacto da expansão urbana na biodiversidade e nas emissões de carbono. Isso porque, por exemplo, em caso de migrações da área rural para a área urbana, a primeira pode permitir que a vegetação natural se regenere, diminuindo o impacto como um todo.

Por outro lado, a população urbana costuma ter uma pegada de carbono maior do que a rural, já que consome mais bens, que podem levar à conversão de habitats não só na proximidade das cidades, mas também longe delas

“A análise nesse artigo apenas examina a ‘marca’ espacial direta da expansão urbana nos hotspots de biodiversidade, espécies AZE, e biomassa de carbono, e não os processos indiretos de uso da terra que tanto causam quanto respondem à urbanização”, escreveram os cientistas.

“A expansão urbana também pode afetar os usos da terra em locais distantes, que por sua vez podem alterar os estoques de carbono, especialmente nos trópicos. Esse efeito da urbanização ‘indireta’ é difícil de quantificar totalmente”, continuaram.

“Em alguns casos, amplificará, e em outros casos, atenuará as perdas de carbono. Sabemos que as cidades sempre dependeram de terras do interior e outros locais distantes para recursos de alimento e combustível, além da assimilação de resíduos. Por exemplo, uma típica casa em Sydney ou Melbourne é responsável por emissões de gases do efeito estufa, extração de água e uso da terra distribuídas por toda Austrália.”

“A magnitude disso nas áreas urbanas significa que a maior parte dos impactos ambientais na futura expansão urbana também é provável de ocorrer fora das áreas previstas a se tornarem urbanas.”

Além disso, os pesquisadores explicaram que mesmo o conceito do que é urbano é algo questionável, então a expressão da urbanização pode variar de acordo com o país e a região. Na análise, os cientistas definiram como urbanização construções, estradas ou infraestrutura periférica, como calçadas. Terras agrícolas não foram consideradas urbanas.

“O que é ‘urbano’ para um groenlandês pode ser uma ‘pequena vila rural’ em uma das províncias orientais da China. A diversidade dessas definições é ainda maior em nível de cidade”, declarou Gerhard K. Heilig, diretor de Estimativas Populacionais e Seção de Projeções das Nações Unidas.

“Os países podem ter várias definições de uma área urbana particular – tais como ‘cidade propriamente dita’, ‘aglomeração urbana’, ‘área metropolitana’ etc. Dependendo de qual definição é usada, as populações da cidade podem ser muito diferentes”, observou Heilig.

Para tentar limitar os efeitos prejudiciais que a urbanização possa ter no meio ambiente, os pesquisadores enfatizaram que é necessário desenvolver estratégias políticas e urbanísticas bem definidas e que levem em consideração a importância que a biodiversidade tem para o ser humano.

“Precisamos repensar as políticas de conservação e o que significa ser uma cidade sustentável. Não tem a ver só com a pegada de carbono, que é o que os prefeitos e planejadores geralmente pensam agora, mas precisamos considerar como a expansão urbana terá implicações para outras espécies inumanas e o valor dessas espécies para as gerações presente e futura”, disse Burak Güneralp, coautor da Universidade A&M do Texas.

“Devido à longa vida e aos quase irreversíveis investimentos em infraestrutura, será vital para as atuais políticas relacionadas à urbanização considerar seus impactos duradouros. As cidades de amanha ainda não foram construídas, há muito que podemos fazer para definir o que esses lugares se tornarão”, concluiu Seto.

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