Fim do mundo e sustentabilidade
Por mais duro que seja o golpe na nossa autoestima e sentimento de superioridade, para a natureza e o planeta somos plenamente dispensáveis. Tudo pode continuar sem nós, a não ser, claro, nós mesmos. A natureza e as demais espécies não são recursos naturais à disposição da espécie humana. Muito menos uma lixeira para nossos restos. Ou revemos nossa visão e atitudes, ou acontecerá com nossa civilização – e talvez com nossa espécie – o que já aconteceu com outras antes.
Não é de hoje que se anuncia o fim do mundo. Os maias, por exemplo, anunciaram o deles para agora, 12/12/2012, só que ironicamente não terão a oportunidade de conferir, por que eles próprios se encarregaram de abreviar a passagem deles pelo planeta. Quando os invasores europeus chegaram por lá, foi para dar o golpe de misericórdia e roubar todo o ouro, por que a civilização maia já estava em declínio pela falta de água. Aliás, situação parecida com a que vitimou a civilização dos faraós, no Egito, e mais tarde a da Ilha de Páscoa. Será que os maias, os faraós e o povo da Ilha de Páscoa não se deram conta dos riscos, ou apenas perceberam quando já era tarde demais? Ou será que escolheram não dar bola para os avisos de alerta?
Qual é a dificuldade em compreender que se estivermos caminhando numa determinada direção, tenderemos a chegar lá? Em 2005, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou um relatório intitulado Avaliação Ecossistêmica do Milênio (AEM), resultado de cerca de quatro anos de estudos intensivos de 1.360 cientistas de 95 países, que produziram um dos documentos mais completos e atualizados sobre a situação do meio ambiente no planeta. O estudo revelou que cerca de 60% de todos os ecossistemas do planeta estão degradados ou sendo usados de um modo não sustentável.
Assim como o colapso de civilizações humanas inteiras, devido ao mau uso da natureza, não é novidade na história humana, a extinção de espécies também não é novidade para a natureza. Os cientistas conhecem pelo menos dez eventos de extinção em massa no nosso planeta. E a natureza se recuperou. O mais recente foi provocado por um meteoro que caiu na península de Yucatán, no Golfo do México, e extinguiu todos os animais terrestres com mais de 25 quilogramas, entre os quais a espécie mais famosa é a dos dinossauros. Sorte nossa que os ancestrais mamíferos estavam na minoria que sobrou, e mais sorte ainda por que não teriam que se esconder mais dos dinossauros, permitindo a nossa existência hoje. Então, o que é crise para uma espécie pode ser oportunidade para outra.
A diferença é que agora o “meteoro” somos nós. E os dinossauros também!
Para compreender a profundidade do nosso impacto na natureza precisamos ir à raiz do problema, ou talvez não consigamos produzir as mudanças além da superfície. Ao contrário do que pensam os cartórios de registros de imóveis e de patentes, o mundo não nos pertence.
Em nossa ilusão e arrogância, temos torcido e retorcido a realidade até que as respostas se encaixem em nossa visão de espécie superior. No passado, aceitávamos a escravidão de outros humanos sob o argumento de serem inferiores, perdedores ou sem alma. Hoje, fazemos o mesmo com os animais e com a natureza. O que nos diferencia das demais espécies não é a inteligência ou sentidos mais apurados. Muitas espécies possuem sentidos mais desenvolvidos que os nossos e também têm inteligência, são seres sensíveis, comunicam-se por meio de sons e gestos, usam ferramentas, etc. O que nos torna diferentes é a consciência. Aparentemente, um atributo exclusivo da espécie humana.
Se por um lado a consciência nos deu uma identidade e nos tornou únicos, por outro, nos deu a ilusão de separação. E daí a nos achar separados da natureza foi um pequeno pulo de nossa imaginação, como se o que fizéssemos à natureza e às demais espécies não fosse nos atingir de alguma forma. Estava dada a largada para o modelo de consumo irresponsável, a concentração de riquezas e a injustiça social e ambiental. Então, se pretendemos sobreviver, teremos de sentir, pensar e agir diferente. Ou nos reposicionamos na natureza, ou, mais cedo ou mais tarde, nossa civilização conhecerá o mesmo destino de outras que nos sucederam.
* Vilmar Sidnei Demamam Berna é escritor e jornalista, fundou a Rebia (Rede Brasileira de Informação Ambiental), em janeiro de 1996 fundou o Jornal do Meio Ambiente e, em 2006, a Revista do Meio Ambiente e o Portal do Meio Ambiente (www.portaldomeioambiente.org.br). Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 do Programa da ONU para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas. Site www.escritorvilmarberna.com.br.
(O Autor)