• 18 de julho de 2017
  • JORNAL DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO
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Petróleo no mar deixa peixes com síndrome de Dory

Estudo revela o efeito nefasto de pequenas quantidades de petróleo no sistema nervoso de espécies que vivem em corais –



e a ameaça a todo o ecossistema



Dory é aquela peixinha de “Procurando Nemo” que perde a memória a todo momento. Algo parecido está acontecendo com seis espécies de peixes que vivem na Grande Barreira de Corais, no Mar Vermelho, na Ásia e no Caribe. Uma pequena concentração de derivados de hidrocarbonetos – algo como um par de gotas em uma piscina – foi o bastante para que algumas espécies de peixes típicas de corais marinhos tivessem o desenvolvimento do sistema nervoso comprometido, passando a apresentar comportamento que contrariam o instinto de sobrevivência, como a dispersão dos cardumes, o deslocamento para mares abertos e a perda da capacidade de reconhecer predadores, como revela uma pesquisa divulgada hoje pela revista científica Nature Ecology & Evolution.



De acordo com o pesquisador australiano Jodie Rummer, da James Cook University, co-autor do estudo, a poluição nos arredores dos corais, especialmente por petróleo, tem de ser rapidamente interrompida, sob o risco de colocar os peixes sob forte ameaça e, consequentemente, todo o ecossistema de corais. “Os peixes de corais formam a base da cadeia alimentar de predadores maiores. Em menor quantidade, reduzem a capacidade de o ecossistema resistir e se recuperar a perturbações ambientais cada vez mais comuns, como a pesca predatória e o aquecimento dos oceanos”, afirmou.



“O petróleo é altamente tóxico ao ambiente marinho e prejudica diretamente os quatro primeiros estágios da vida dos peixes, o momento mais crítico de luta pela sobrevivência”, disse Rummer. Em outras palavras, significa que os peixes que nascem em águas com alguma concentração de petróleo são mais ‘abobados’, segundo Rummer, e tem uma chance menor se superar o período pós-eclosão, que inclui o período larval; a fase em que a espécie busca encontrar seu habitat adequado; o período em que aprendem a identificar e evitar predadores.



As pequenas concentrações de óleo usadas no estudo já são comuns em muitas regiões costeiras do planeta onde há perfurações para a exploração de petróleo. Mais de seis milhões de toneladas de derivados do petróleo já foram lançados no oceano este ano, resultado de processos industriais e de transporte e mais de 340 grandes acidentes com derramamento de petróleo aconteceram nos últimos 40 anos, o que significa cerca de 3.900 milhões de toneladas de petróleo bruto derramados no mar.  Mesmo assim, muitos governos ainda estimulam o aumento da atividade industrial nas proximidades dos habitats de recifes, vide o exemplo dos corais da Amazônia.



Os recém-descobertos corais da Amazônia, no encontro do Rio Amazonas com o mar, estão sob forte ameaça. Petrolíferas já têm processos de licenciamento avançados para instalar na região uma base para a exploração de petróleo. O recife de 9,5 mil quilômetros quadrados de formações, que incluem esponjas gigantes com mais de 2 metros de comprimento e algas calcárias pouco conhecidas, podem desaparecer antes de serem conhecidos.



Apenas nos últimos 35 anos o planeta perdeu cerca de 19% dos recifes de coral do mundo e mais 15% devem sumir nas próximas duas décadas. Ao lado da perda de biodiversidade tem-se também o prejuízo econômico e a ameaça a subsistência de 400 milhões de pessoas: o ecossistema fornece cerca de US$ 30 trilhões em receitas anuais que resultam da pesca e do turismo.



De acordo com a Unesco, países com áreas de recifes de corais deveriam se esforçar ainda mais para manter a temperatura abaixo de 1,5° Celsius, sob o risco de perder completamente o ecossistema. A medida se aplica ao Brasil, que na lista de patrimônios naturais mundiais tem o arquipélago de Fernando de Noronha e o Atol das Rocas.


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